Seu Salomão, guiado pela fé e pela paixão de viver

Seu Salomão, guiado pela fé e pela paixão de viver

Falante e feliz, esse é o Salomão Felicio dos Santos. Com 87 anos, já fez de tudo um pouco nessa vida. Ajudou na colheita de algodão, foi engraxate e faxineiro. Isso sem contar sua longa passagem pelo hospital onde começou como auxiliar de enfermagem, mas adquirindo experiência passou a fazer pequenas cirurgias, drenagem abscesso e sutura. Depois ainda atuou no setor de traumatologia e Raio-X, sem contar que certa vez assumiu a função de anestesista geral. Confira a entrevista com Seu Salomão, um cidadão que é guiado pela Fé e pela paixão de viver.

Onde o senhor nasceu e cresceu?
Nasci na Paulista, na Taguaruçu, em uma área que meu pai era posseiro de cinco mil alqueires de terra. Depois fui pra Fazenda Rio Preto, passei pela Santa Maria, Jangada, Perez e algumas outras propriedades.

Meu pai faleceu em 1939, ele tinha varizes esofágicas (veias de calibre aumentado no esôfago) e uma certa noite ficou em casa colocando sangue pela boca, morreu esgotado. A gente colocou folha de bananeira para estancar, mas não tinha jeito, foi bem triste. A a minha mãe faleceu em 1996, viveu 96 anos.

Em 1942, mais ou menos, tínhamos uma roça que o lagarto comeu dois alqueires de arroz. Quem nos acolheu foi Emilio Lustosa com seu maquinário, mas não dava mais tempo, já tinha comido tudo e estava só o tale. Depois de alguns anos mudamos para Mirandópolis, isso em 1946, chegando na cidade e a minha mãe arranjou uma caixa de engraxate e me levou para engraxar sapato.

Ficou bastante tempo trabalhando assim?
Não, com as graças de Deus comecei a trabalhar na casa do Dr. Edgar Raimundo da Costa. Era faxineiro, lavava prato, fazia café e tudo mais. Entrei na casa dele com uns 15 anos e sai com 18, quando consegui ser admitido como atendente de enfermagem no Hospital de Mirandópolis.

Já tinha feito algo na área hospitalar?
Nada, não tinha experiencia. Cheguei no hospital e o Dr. Heitor Saldanha Franco era diretor. Lá fiz de tudo um pouco. Depois de um certo tempo comecei a fazer pequenas cirurgias, drenagem abscesso, sutura, passei no setor de traumatologia, Raio-X e como anestesista geral.  Ninguém morreu na minha mão.

Você estudou enfermagem?
Só depois de um tempo que consegui, em 1972. Fui fazer um curso de auxiliar de enfermagem em São Paulo. A direção do hospital queria que fizesse um curso para cuidar do setor de Raio-X. O pior é que como fui fazer enfermagem, e não o Raio-X, o pessoal cortou a verba da passagem e com isso até faltou comida em casa (choro). Quando voltei vim com muita vontade de entregar o que tinha aprendido em São Paulo.

Com tanta experiência, tem alguma passagem curiosa?
Teve um dia que estava deitado pra dormir e o Tião, do Hospital, chegou em casa falando que precisava ir pra lá porque o médico não conseguia pegar a veia da criança. Ele tinha dado mais de 40 furadas na criança. Pedi o foco (luz forte) e com menos de dois minutos já tinha colocado o cateter. A criança é o filho do Ernesto Zanco, que já veio me visitar várias vezes.

Quando aposentou?
Na verdade, aposentei porque já estava com mais de 35 anos de serviço e não tinha hora certa pra sair do hospital. Muitas vezes meu horário era meio dia e ficava até oito da noite porque gostava do que fazia. Além disso, via que faltava profissional e ficava ajudando. Com isso uma diretora falou que iria cortar o meu ponto, daí um certo dia não recebi meu pagamento. Ela falou que acostumei o povo mal e que eu iria pagar por isso. Chorei bastante, mas falei: que Deus te abençoa, fica com o seu hospital porque vou embora. Daí aposentei do hospital em 1988, já na Usina aposentei em 1998.

Teve algo que desabonou?
Além disso, só de nunca ter pego uma chefia. O que me tranquiliza é que sei que não consegui porque trabalhava e não tinha tempo de ficar bajulando o pessoal.

Quando surgiu sua paixão com as frutas?
Depois que aposentei comecei a mexer com roça. Hoje tem acerola, caqui, uva e algumas outras. E o detalhe é que o passarinho pode comer, tudo sem agrotóxico.

Acompanhou o desenvolvimento de Mirandópolis?
Sim, cheguei aqui em 1946. O primeiro asfalto e o esgoto, as diversas construções e tudo mais. Gosto de andar pela rua, de beijar (cumprimentar) o povo e de ser amigo do povo. Cresci e vou morrer aqui, sou muito feliz em Mirandópolis.


                       
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