Das raízes no interior à educação nacional: a jornada inspiradora de Raquel Volpato Serbino, a “Menina de Lavínia”

Foto: Arquivo Pessoal / Raquel Volpato
Por 11 anos, Lavínia foi o cenário da infância de Raquel Volpato Serbino, uma mulher que, ao longo de sua vida, se tornou um dos principais nomes quando se fala de Educação no Estado de São Paulo. Nascida em Lavínia, no dia 4 de novembro de 1945, Raquel foi a quarta filha de Ida Volpato e José Volpato (Seu Zico), dois trabalhadores rurais que, com muito esforço, conseguiram realizar o sonho de formar seus dez filhos, dando-lhes as melhores oportunidades de estudo e crescimento.
Raquel guarda as memórias de sua infância em Lavínia com carinho e riqueza de detalhes. Para ela, Lavínia foi um verdadeiro “quintal” onde ela e seus nove irmãos cresceram, em um ambiente de simplicidade e aprendizado. “Minhas melhores lembranças são de Lavínia. Estudávamos no Grupo, e à tarde nos divertíamos brincando de pega-pega, esconde-esconde, salva e queimada até a noitinha. Eu ainda me lembro do apito do trem que passava e do gosto dos doces da Sorveteria Farani e do Bar do Calças”.
A cidade, na época, com suas festas tradicionais, procissões e o convívio comunitário, foi o berço da educadora. Raquel relembra as matinês no cinema, as roupas bordadas por sua mãe e as tardes passeando pelo jardim da cidade, sempre com o apoio da família. A paixão por educação e cultura começou cedo, quando, ainda criança, participou de peças teatrais na escola, interpretando personagens como Carmem Miranda e Cinderela.

MUDANÇA PARA CAMPINAS
Com muito esforço, Seu Zico deixou de ser trabalhador rural e tornou-se comerciante, montando um armazém, primeiro na Av. Lavínia e depois na rua Araribá. Como comerciante prosperou e decidiu se mudar para uma cidade maior para que os filhos pudessem continuar estudando.
“Meu pai não gastava um centavo fora do orçamento que não fosse com a nossa educação. Ele tinha o sonho de formar os dez filhos e formou, parecia um objetivo muito alto para o padrão de vida que nós tínhamos, mas ele conseguiu. Ele sonhava em formar todos como “médicos”, a profissão que ele gostaria de ter exercido, se pudesse estudar. Alguns fizeram medicina sim, mas eu sempre fui vocacionada para o magistério. Meu pai foi o homem mais inteligente que eu conheci no sentido de traçar metas e ter a disciplina de cumpri-las.”
O dia da mudança foi um divisor de águas na vida de Raquel. “Eu sempre digo que a minha infância acabou quando eu mudei de Lavínia. Quando eu vi aquele trem saindo e todos os meus amigos se despedindo, ali acabou minha infância. Aí para mim parece que eu passei a ser adolescente no outro dia.”
Ao chegar em Campinas, a menina se encantou com a “cidade grande”. Porém, mesmo rodeada de luzes e novos desafios, nunca deixou de recordar Lavínia. “O que me fez seguir meus sonhos foi a excelente base que eu recebi em Lavínia. Na escola em Campinas, me destaquei como presidente do grêmio e do jornal estudantil”, conta.
Raquel seguiu o caminho da educação, concluindo o magistério e a pedagogia. A vocação para o magistério se consolidou, e sua carreira tomou rumos cada vez mais notáveis. Ao se formar, ela lecionou em várias instituições, incluindo o ensino de francês no ginásio, e, em Bauru, fez pós-graduação em gestão escolar, prestando concurso para a UNESP, onde lecionou até sua aposentadoria em 1994.
Na carreira docente defendeu sua Tese de Doutoramento na UNESP em 1974. E fez seu Pós Doutorado na Faculdade de Educação da USP em 1989. O foco de seus estudos foi sempre Formação de Professores para todos os níveis da Escola Brasileira.

EDUCAÇÃO PÚBLICA
Raquel foi pioneira na criação de cursos voltados para a formação de educadores. Ela fundou o Congresso Paulista de Formação de Educadores, um evento que gerou grandes transformações na área da educação e obteve reconhecimento nacional. Graças a sua dedicação, a FAPESP passou a financiar projetos de pesquisa em Formação de Professores, um marco para a educação paulista.
Com uma carreira consolidada, foi convidada no governo de Mário Covas para coordenar as escolas do interior paulista, onde esteve à frente de mais de 500 municípios. Durante sua gestão, Raquel se destacou pela atuação na reestruturação da educação pública, enfrentando desafios e superando resistências com firmeza e inteligência.
“Eu acredito que sob liderança da Secretaria de Educação Rose Neubauer, nós conseguimos executar um vigoroso projeto de reorganização da educação pública paulista. Mexer com estruturas não é fácil, desacomoda todos os atores envolvidos. Porém, não se melhora a educação sem mexermos na estrutura. Isso abalou, teve muito enfrentamento porque as pessoas têm ideias diferentes, sentem-se desacomodadas e reagem, mas até hoje recebemos manifestações de reconhecimento pelo trabalho realizado nesse período.”
A professora também foi membro do Conselho Estadual de Educação. “Confesso que não foi a melhor experiência, prefiro a gestão à normatização.”
OUTRAS EXPERIÊNCIAS
Raquel também teve uma trajetória importante fora de São Paulo. Após seus filhos se mudarem para Porto Velho, Rondônia, ela e seu marido se estabeleceram na cidade, onde Raquel contribuiu com sua experiência em Educação. Em São Paulo, no governo Geraldo Alckmin, foi convidada para ser Subsecretária de Articulação da Secretaria de Educação, e pôde realizar um trabalho abrangente que resultou numa ótima avaliação do MEC: O Estado de São Paulo obteve os melhores índices do país em todos os níveis da Educação Básica naquele ano. Uma vitória que foi muito comemorada. “Foi o trabalho que me curou do luto,” diz Raquel, referindo-se à morte de seu marido, Dr. José Wilson Serbino, médico dermatologista, com quem compartilhou mais de 40 anos de sua trajetória.
Com um currículo recheado de vitórias e transformações, Raquel Volpato Serbino decidiu então parar de trabalhar e dedicar-se mais aos filhos e netos. No entanto, seu legado na educação e cultura continua vivo através de suas ações e da memória daqueles que, como ela, acreditam no poder da educação para transformar vidas.