Justiça suspende abonos salariais pagos a servidores municipais em Mirandópolis
O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) suspendeu, por meio de uma liminar (decisão temporária), os abonos salariais que foram incorporados a partir de 1º de janeiro de 2019 e os que estavam sendo pagos neste ano aos servidores públicos da prefeitura, do Ipem (Instituto de Previdência Municipal), Saaem (Serviço Autônomo de Água e Esgoto de Mirandópolis) e Câmara Municipal. Os benefícios chegam a R$ 120 por servidor, somados os valores já incorporados e aqueles referentes ao novo abono. Cabe recurso.
A decisão do Relator, Geraldo Wohlers, atendeu pedido da Procuradoria-Geral de Justiça. Ambos os benefícios foram pagos aos funcionários dos órgãos citados por meio de Leis Municipais criadas durante o mandato da ex-prefeita Regina Mustafa (PV) e de José Antonio Rodrigues (SD), enquanto a substituía no cargo.
Ao deferir a liminar, Wohlers destaca que ficou comprovado que as criações das leis caracterizaram “perigo de dano” já que, segundo o magistrado, “uma vez que a concessão de abono salarial nos termos delineados onera o erário”.
O pedido de suspensão da Procuradoria à Justiça ocorreu após o Ipem ingressar com representação alegando que o valor de R$ 60 pago em 2018 e incorporado em 2019 não fez parte da base de cálculo da contribuição previdenciária dos servidores efetivos e que, portanto, não poderia ser incorporado.
Após tomar ciência da decisão do Relator, o prefeito interino Carlos Weverton Ortega Sanches (MDB) realizou reunião com os funcionários da prefeitura na semana passada, no Ginásio de Esportes, com intuito, segundo ele, de esclarecer os fatos. Entretanto, poucos compareceram ao local.
Na visão do procurador-geral de Justiça, que solicitou a suspensão, Gianpaolo Poggio Smanio, a concessão dos abonos salariais no valor de R$ 60 mensais pagos aos servidores públicos não se compatibiliza com os princípios da moralidade, razoabilidade, finalidade e interesse público, não atendendo, segundo ele, “às exigências do serviço e comprometendo também a eficiência da máquina administrativa”.
AS LEIS
Cinco leis, ao todo, foram criadas concedendo abonos salariais aos servidores da prefeitura, Saaem, Ipem e Câmara Municipal (2906/2018, 2908/2018, 2922/2018, 2947/2019 e 2949/2019), e outras duas (2946/2019 e 2948/2019) incorporaram o abono pecuniário aos vencimentos e salários dos servidores.
Com exceção das Leis Municipais nº 2908/2018 e 2948/2019, ambas de iniciativa do Poder Legislativo, todas as demais foram impugnadas na Ação Direta de Inconstitucionalidade.
A lei 2906 de 2018, criada em fevereiro por José Antonio quando assumiu a Prefeitura por conta do afastamento médico de Regina Mustafa, concedeu abono salarial no valor de R$ 60 aos servidores públicos municipais ativos, inativos e pensionistas, vinculados à folha de pagamento do Poder Executivo até 31 de dezembro do mesmo ano. Meses seguintes, em agosto de 2018, já com Regina Mustafa na prefeitura, nova lei (2922/2018) foi criada para conceder o mesmo valor de abono aos servidores do Saaem.
Já em 31 de janeiro de 2019, a prefeita criou a lei 2946/2019 que incorporava os R$ 60 pagos em 2018 nos vencimentos e salários dos funcionários da prefeitura, Saaem e Ipem. A Chefe do Executivo também elaborou novo projeto de lei (Lei nº 2947/2019) para conceder novo abono salarial somente aos servidores ativos da prefeitura no valor de R$ 60, com vencimento em 31 de dezembro de 2019.
Todas as leis criadas tanto por Regina quanto por José Antonio foram aprovadas pelos vereadores da Câmara Municipal, de forma unânime. Os funcionários do Poder Legislativo, inclusive, também se beneficiaram de abono salarial de R$ 60 através da lei 2949/2019.
Para a Procuradoria, os pagamentos de vantagens pecuniárias ou de qualquer outra natureza para servidores públicos só é legítima se realizada em conformidade com o interesse público e com as exigências do serviço. O procurador segue dizendo que as leis criadas para conceder abonos salariais aos inativos e pensionistas são inconstitucionais, na medida que, de acordo com ele, não se permite complementação de aposentadoria ou pensão sem fonte de custeio.
“Tais diplomas legais outorgam verdadeira complementação de benefícios previdenciários mercê da inexistência de fonte de custeio, pois ela é paga exclusiva e integralmente por recursos oriundos do erário”.
CONTESTA
Procurada, a defesa que assessorou a ex-prefeita Regina Mustafa contesta a decisão do TJ-SP. Segundo o advogado Ricardo Pontes, todas as leis criadas durante a gestão seguiram critérios legais. Os projetos de lei tiveram como fundamento decisão de 2011 do próprio TJ-SP, por meio do presidente à época José Roberto Bedran e relator Mauricio Vidigal (Acórdão nº 03566819).
O acórdão que a defesa de Mustafa se refere é o pagamento de abono salarial aos servidores da cidade de Penápolis. Naquele ano, os desembargadores entenderam que os abonos salariais pagos aos servidores penapolenses, ativos, inativos e pensionistas, foram legais pois, segundo os magistrados, não ocorreu revisão de remuneração, mas sim aumento. “A elevação dos salários dos que ganham menos em valores iguais aos aumentos dos que ganham mais objetiva diminuir a diferença entre os padrões de vencimentos”, disseram à época.
“O mesmo entendimento tem tido o governo federal com relação ao salário mínimo, sem que ocorra violação ao princípio constitucional da isonomia, porque são situações diferentes a daqueles que ganham pouco e a daqueles que ganham mais”, sentenciaram os desembargadores. Naquela ocasião, eles julgaram improcedente a ação ajuizada pelo então Prefeito Municipal de Penápolis em face do Presidente da Câmara Municipal daquela cidade.
Além disso, Pontes já havia dado parecer ao Ipem quanto a incorporação do abono salarial de 2018 que, segundo o Instituto, poderia gerar impacto financeiro e atuarial. “O abono salarial concedido à época tratava-se de verba provisória e de natureza jurídica indenizatória. Sendo assim, não haveria que se falar em incidência da contribuição previdenciária sobre o valor de R$ 60 durante o exercício de 2018. Posteriormente, ao incorporar o abono salarial a partir do mês de competência – janeiro/2019, referido valor passou a integrar os vencimentos e salários dos servidores, ou seja, deixou de ser provisório e se transformou em definitivo, atraindo para si, a partir de então, a incidência da contribuição previdenciária”, alegou o advogado à época.
O QUE DIZEM OS CITADOS
A reportagem entrou em contato com a Prefeitura, Ipem, Saaem e Câmara Municipal. O Saaem disse que irá aguardar recurso da Prefeitura. Já a Câmara dos Vereadores informou que a partir deste mês os servidores deixarão de receber o abono e que o setor jurídico da Casa de Leis irá apresentar a contestação dentro do prazo legal. O Poder Legislativo disse também que as leis municipais que concederam os abonos são legais e constitucionais e que todos os funcionários já estão cientes da suspensão do pagamento do abono. A Prefeitura e o Ipem não se manifestaram até o fechamento desta edição.