Os dois redis
Há algo de atemorizante nas leituras da Missa do domingo passado. Na primeira leitura, disse São Pedro à multidão: “Deus constituiu Senhor e Cristo a este Jesus que vós crucificastes” (Livro dos Atos dos Apóstolos, cap. 2, v. 36), e a reação ao seu discurso foi que “eles ficaram com o coração aflito, e perguntaram a Pedro e aos outros apóstolos: “Irmãos, o que devemos fazer?” (v. 37) – uma atitude de conversão diante da verdade escancarada.
Se lemos sem cuidado o Salmo 22(23) e o Evangelho de São João (cap. 10, vv. 1-10), temos a impressão de que Jesus é um pastor universal que conduz indiscriminadamente a todos por “prados e campinas verdejantes” (v. 2 do Salmo). Mas não é assim; o verso 4 do Evangelho diz que “depois de fazer sair todas as que são suas,” Jesus, o Bom Pastor, “caminha à sua frente, e as ovelhas o seguem, porque conhecem a sua voz”, o que significa que nem todas as ovelhas são suas, mas de outro pastor qualquer (dinheiro, fama, rapinagem, roubo, mentira, falsas acusações, maldades e tantos vícios, depravações e corrupções).
É o que diz o Senhor no Evangelho de São Mateus: “Quem não está comigo está contra mim; e quem não ajunta comigo, espalha” (cap. 12, v. 30). E é por isto que no versículo 40 da primeira leitura, São Pedro adverte: “Salvai-vos dessa gente corrompida!” – pois embora Deus deseje que todos se salvem, a realidade, clareada pela Sagrada Escritura, mostra que nosso livre arbítrio é irrevogável e que cada um escolhe permanecer em Cristo ou se dispersar. E na segunda leitura (Primeira Carta de São Pedro, cap. 2), o apóstolo ensina ainda que, tendo morrido para o pecado, devemos viver para a justiça – esta vem de Deus pois Ele é quem julga com justiça.Os primeiros monges que se refugiaram no deserto buscavam fugir da corrupção do mundo e achegar-se a Deus em santidade – esta foi sua escolha radical. E a nós, mesmo não tendo vocação para a vida reclusa, cabe a mesma decisão, que não pode tardar: escolho a Cristo e sua justiça, vivendo como ovelha do seu redil para habitar nas moradas eternas do Céu, ou a um ídolo qualquer, que pastoreia as almas dos réprobos pelos caminhos dos prazeres mundanos rumo aos recôncavos pestilentos do inferno?