“Não tinha forças para morrer, pois estava devastado”, conta Padre Orlando sobre a Covid

“Não tinha forças para morrer, pois estava devastado”, conta Padre Orlando sobre a Covid

Conversamos com Orlando Aparecido Maffei, o Padre Orlando, que nasceu em 1964 em Reginópolis, local onde cresceu com sete irmãos. Como desde pequeno já sabia que seria padre, depois de terminar o segundo grau foi em busca de oportunidades. Trabalhou em Andradina, Nova Independência, Araçatuba e Guaraçaí antes de chegar em Mirandópolis, em janeiro de 2020. Confira abaixo a entrevista completa.

Como foi sua infância?

Nasci em 1964, em Reginópolis. Cheguei de surpresa porque minha mãe estava de sete meses, então nem foi para o hospital, nasci na própria casa. Foi uma infância tranquila, somos em oito irmãos, todos vivos, inclusive meus pais que ainda moram em Reginópolis estão bem de saúde, graças a Deus.

E a igreja?

Comecei a fazer o trabalho de servimento vocacional, foi quando aceitei ir para Valparaiso, com o antigo Padre Jorge, mas justamente quando estava lá a minha avó faleceu e acabei voltando pra casa. Daí precisei esperei mais um ano para fazer, foi em 1989 senão me engano, só que daí era em Promissão. Lá era o Padre Messias, vocês de Mirandópolis amam ele, foi uma pessoa muito importante na minha vida.

Como foram as experiências?

Fiquei cinco anos em Andradina, que era o Padre José Arlindo e Orides, que me acolheram muito bem. Só que um diferencial foi em Nova Independência, pois estava uma situação complicada. Tínhamos um projeto com a Unicef e Pastoral da Criança, fizemos um plano de hortas comunitárias, granjas e tratamento de água e esgoto. Naquela época eles não tinham infraestrutura básica, então conseguimos realizar o projeto e deixar a nossa marca na cidade.

Depois me chamaram para a Paroquia Santana, em Araçatuba, mas com a responsabilidade de morar e cuidar dos seminaristas. Fiquei lá cerca de nove anos cuidando dos futuros padres, foi quando entrou o Padre Messias e eu fiquei apenas na paroquia. Mas essa igreja é muito grande, envolve muitos bairros. Foram anos de muito trabalho, uma passagem marcante que foi um verdadeiro sonho de Deus. De Araçatuba fui para Guaraçaí, foi importante porque precisava recarregar as energias. O engraçado é que fiquei só um ano, quando estava engrenando o pessoal me designou para Mirandópolis, já que o Padre Alexandre estava saindo. Fiquei bem sentido porque o povo de Guaraçaí é encantador, mas sabia que Deus tinha um desafio importante na minha vida.

Conhecia Mirandópolis?

Somente a igreja matriz por causa do Cerco de Jericó, mas a cidade não conhecia nada. Não sabia dos bairros e assentamentos, não tinha ideia do tamanho do desafio. Sempre que estou saindo do lugar peço para o atual padre me mostrar para apresentar as pessoas, foi quando comecei a ter uma real dimensão do que era Mirandópolis. Chegue em janeiro de 2020.

Logo depois veio a pandemia?

Não deu tempo de estruturar e começou a pandemia. O primeiro impacto foi o Domingo de Ramos, mas nos reinventamos e conseguimos criar alternativas. Em seguida teve Nossa Senhora de Fátima, fizemos uma carreata maravilhosa, depois Corpus Christi, Festa do Padroeiro e assim fomos levando. A sociedade é bem participativa, procuramos alternativas e conseguimos dar assistência aos necessitados. Quando cheguei era 40 cestas básicas distribuídas, com a pandemia chegamos a assistir mais de 200 famílias com a cesta. Isso só é possível porque as pessoas em Mirandópolis gostam de ajudar.

Você passou um susto com a Covid?

No dia 3 de março começou uma dor muito forte no corpo, imaginei que poderia ser o cansaço, já que acordo muito cedo. Então pensei que dormindo estaria tudo bem, mas quando acordei não estava legal. Na sexta começou a febre, no sábado do mesmo jeito, no domingo não teve jeito. Fiquei muito ruim, liguei para uma amiga de Araçatuba e fui alertado para ir no médico com urgência. Quando cheguei no pré-atendimento já vi que as coisas não estavam boas. A tomografia mostrou que estava com mais de 25% do pulmão comprometido. Comecei a tomar os remédios e fui orientado a ir para um rancho que tenho para ficar isolado. O exame deu embolia pulmonar, foram dias muitos difíceis porque não conseguia dormir e nem comer, o cheiro da comida me dava enjoo, não tinha força para nada.

Pensou que iria morrer?

Digo que não tinha forças para morrer, pois estava devastado, ficava amuado o dia todo no sofá sem dormir e comer. Na quinta-feira, depois de uns quatro dias, amanheci muito bem, achei que estava curado, mas no outro dia foi o pior, acordei com uma febre muito alta, os remédios não cortavam e foi preciso ir para o hospital novamente. Aproveito para agradecer a Doutora Fabiana Pardo, uma pessoa de Deus, que se dedicou a encontrar a minha cura. No hospital já fui para a internação e o médico tentava de tudo e não resolvia, isso foi me dando um desespero. Meus pulmões no sábado estavam mais de 50% comprometidos, fiquei com muito medo. Nunca tive diabete e os exames mostravam uma diabete descontrolada, esse vírus é muito complicado. Deixei na mão de Deus, pois via que os médicos estavam tentando a cura. Com a graças de Deus a minha febre abaixou na segunda à noite e as coisas começaram a estabelecer. Fiquei alguns dias no rancho novamente até acabar o isolamento para voltar poder voltar para Mirandópolis. Além de mexer com o corpo, esse vírus mexe muito com a nossa cabeça, não é fácil.


                       
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