Reflexões quaresmais (3)
Foto: A12
No domingo (18), o primeiro da Quaresma, ouvi uma interessante homilia, baseada no Evangelho de São Marcos (cap. 1, vv. 12-15), em que Jesus é levado ao deserto pelo Espírito Santo e lá é tentado pelo demônio. O padre falava da Quaresma como um tempo de passagem pelo deserto – não geográfico, mas espiritual. E aparentemente com o sentimento de quem se vê contemplado na Sagrada Escritura, ele dizia que a nossa própria vida é recheada de “desertos”, que são as perdas, separações, doenças, dores, aflições, tribulações… Sabemos que esta vida é mesmo assim, apesar da anestesia recebida pelas últimas gerações, envoltas em tecnologias e facilidades, mas vítimas dos excessos do conforto e do prazer, verdadeiras armadilhas para a alma.
E é aqui que se encontra, digamos, a espiritualidade do deserto: submetendo o corpo às privações, busca-se fortalecer e curar a alma. Diferentemente do que pregam as doutrinas reencarnacionistas, o corpo não é um peso a ser carregado, nem a matéria é má; o corpo foi criado por Deus e, portanto, é bom, mas nós carregamos as marcas da queda, do pecado, e por isso, como diz São Paulo, “castigo o meu corpo e o mantenho em servidão, de medo de vir eu mesmo a ser excluído depois de eu ter pregado aos outros” (Primeira Carta aos Coríntios, cap. 9. V. 27).
Assim, as privações, as penitências, as dores e sofrimentos, o suportar as tribulações com paciência, tudo isso deve ser assumido como caminho de conversão. Na Quaresma, acentuam-se as privações voluntárias para controlar nossos apetites e permitir que reine nossa alma – pois do contrário, entramos na dinâmica do mundo, naufragado em excessos, devassidão, drogas, luxúria, vaidade, avareza… Mesmo para as pessoas mais controladas, as abstinências quaresmais são necessárias, para evitar o espírito de apatia, preguiça e individualismo próprio de quem não passa por privações e dificuldades, mas é incapaz de se compadecer com quem sofre e desconhece a caridade.
Queridos irmãos, busquemos nesta Quaresma o domínio das paixões desordenadas e a oferta de nossos sacrifícios a Deus. Assim como no deserto, Jesus foi cuidado pelos anjos, nos desertos da nossa vida ou das nossas penitências, não faltarão os cuidados divinos ao coração confiante e obediente.